quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O Luizinho da segunda fila


Marcelo é um excelente professor de Geografia.
Na aula sobre o Pantanal até excedeu-se. Falou com entusiasmo, relatou com detalhes, descreveu com precisão. Preencheu a lousa com critério, soube fazer com que os alunos descobrissem na interpretação do texto do livro a magia dessa região quase selvagem. Exibiu um vídeo, congelou cenas e enriqueceu-as com detalhes, com fatos experimentados, acontecimentos do dia-a-dia de cada um.
Em sua prova, é evidente, não deu outra: uma redação sobre o tema e questões operatórias que envolviam o Pantanal. Seus rios, suas aves, sua vegetação... a planície imensa. Os alunos acharam fácil. Apanharam suas folhas e começaram a trazer, palavra por palavra, suas imagens para o papel. As canetas corriam soltas e as linhas transformavam-se em parágrafos. Marcelo sabia o quanto teria que corrigir, mas vibrava... Sentia que os alunos aprendiam. Descobria o interesse que sua ciência despertava. Não pôde conter uma emoção diferente quando Heleninha, sua aluna predileta, foi até sua mesa e arfante solicitou:
- Posso pegar mais uma folha em branco?
O único ponto de discórdia, o único sentimento opaco que aborrecia Marcelo, era o Luizinho, aquele da segunda fila. - Puxa vida! - pensava - Luizinho assistira todas as suas aulas, arregalara os olhos com as explicações e agora, na prova, silêncio absoluto, imobilidade total... nem sequer uma linha. Sentiu ímpetos de esganar Luizinho. Mas, tudo bem, não queria se irritar. Luizinho pagaria seu preço, iria certamente para a recuperação. Se duvidassem poderia, até mesmo, levá-lo à retenção. Seria até possível arrancar um ano inteirinho de sua vida...
Minutos depois, avisou que o tempo estava terminando. Que entregassem sua folha. Viu então que, rapidamente, Luizinho desenhou, na primeira página das folhas de prova, o Pantanal. Rico, minucioso, preciso. Marcelo emocionou-se, ao ver aquele quadro, de irretocável perfeição, nas mãos de Luizinho que coloria as últimas sobras. Entusiasmado indagou:
- E aí, Luís? Você já esteve no Pantanal?
Não. Luizinho jamais saíra de sua cidade. Construiu sua imagem a partir das aulas ouvidas. Marcelo sentiu-se um gigante e, de repente, descobriu-se o próprio Piaget.
Havia com suas palavras construído uma imagem completa, correta e absoluta na mente de seu aluno.
Mas, deu zero pela redação. É claro. Naquela escola não era permitido que se rabiscassem as folhas de prova. A história de Luizinho repete-se em muitas escolas.
Sua inteligência pictórica é imensa, colossal, lúcida, clara e contrasta visivelmente com as limitações de sua competência verbal. Expressou o que sabia, da maneira como conseguia.
Mas, não são todos os professores que se encontram treinados para ouvir linguagens diferentes das que a escola instituiu como única e universal.
Celson Antunes

12 comentários:

  1. Ao ler o texto senti as emoções do professor e me coloquei também no lugar do aluno. Imaginei-me como professor e como aluna. Posso dizer que lecionar é um desafio. Ser aluna também. No exemplo do professor Marcelo acima descrito, cabe-nos pensar: Ele deveria ter passado por cima do regimento da escola? Deveria ter formas diferentes de avaliar o aluno? Com esta reflexão, cada um pode adequar a prática pedagógica que beneficiará o ensino dos alunos

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  2. O texto demonstra com total entusiasmo um tipo de professor que atualmente, é dificilmente visto em nossas escolas.
    Porém, como todo ser humano não é perfeito, Marcelo não poderia fugir a essa regra.
    Apesar de excelente professor, de explicar e transmitir o conhecimento facilmente, de usar recursos além da lousa e do pincel, Marcelo pecou na avaliação. Pecou como? Pecou pois não teve a sensibilidade de perceber que Luisinho não fez a dissertação por falta de conhecimento, e sim por ter dificuldade em se expressar nesse tipo de avaliação. Pois o aluno mostrou total conhecimento do assunto da prova, ao desenhar o Pantanal, rico em detalhes, sem nunca ter visitado o local.
    É por esse motivo que nós como futuros educadores, temos que estar atentos a casos como este. E aplicar avaliações diversificadas em sala de aula, não se atendo somente à burocracia da Instituição de Ensino, e sim nas dificuldades do seu alunado. Pois o primordial no processo de avaliação é o APRENDIZADO e não a nota.

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  3. Às vezes o sistema limita e dita regras das quais nem todos estão dispostos a quebrá-las como nessa escola o sistema nunca aceitaria uma prova em branco, porém professor limitou-se apenas aquilo, deixando de lado o conhecimento adquirido pelo aluno não valorizando sua forma de expressão. Sabemos que é complicado quando não são respondidas as perguntas feitas, e para uma escola que dita regras muitas pessoas no lugar de Marcelo, seguiria o modelo. Infelizmente em muitas vezes avaliação não é feita com clareza fugindo do principal objetivo a aprendizagem.

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  4. Nossa esse texto é bastante envolvente, me sinto um pouco dividida. Pois é claro que o professor tem que diversificar as maneiras de avaliar seu aluno, até porque nós somos diferentes uns dos outros, então o que é fácil pra mim pode ser difícil pra Fredy o que eu entendo desenhado Fredy entende escrito, logo, percebemos que cada um tem limitações diferentes!
    Mas o que me incomoda, é o seguinte:
    Se Marcelo avaliasse Luizinho levando em consideração o que ele aprendeu (é isso que importa) quem ensinaria Luizinho a elaborar uma dissertação? E se ele precisar fazer um concurso ou até mesmo um vestibular, será que se ele desenhar quem corrigir vai aprová-lo? Então a diversificação no ato de avaliar só vale na sala de aula?Sabendo que o professor também tem o dever de preparar o alunado para o mercado de trabalho, como considerar diversos métodos avaliativos, sendo que vai ser cobrado ao aluno (caso ela queira fazer um concurso publico) um único método avaliativo?

    Aguardo respostas!

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  5. Mary o texto refere-se a um aluno da séries iniciais.
    Com relação a seus questionamentos que por sinal são bem interessantes, vamos refletir:
    È papel (função) de todos professores de qualquer disciplina mediar o conhecimento, ou seja, ensinar a dissertar.
    Outra aspecto é que estamos tratando de avaliação da aprendizagem e não de exame. Devemos diversificar os instrumentos avaliativos.
    Concurso público, vestibulares e ENEM são exames, isto é, tem como função selecionar, já a avaliação da aprendizagem tem como função diagnosticar e formar.

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  6. Os métodos avaliativos devem ser de conhecimento dos professores. Neste caso, vimos que Luizinho, vai retirar uma nota baixa, pois seu professor apesar de ter um ótimo domínio de conteúdo fazendo com que a aula fosse produtiva, foi incapaz de perceber uma provável deficiência do garoto se esquecendo que nem todos saberiam se expressar escrevendo ,já que ele desenhou ao invés de escrever uma redação. Ele não levou em consideração a riqueza dos detalhes no desenho, mesmo sabendo que o garoto nunca tinha ido ao Pantanal, ou seja, aquele desenho foi fruto da boa aula que ele deu. Onde vem a tona mais uma vez, o que foi comentado em outra crônica o que importa é o que a quantidade pode oferecer ,pois de nada valeu o desenho de Luizinho já que dele não terá como obter uma nota.

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  7. O texto nos faz pensar sobre o que realmente é um processo de avaliação, muitos professores então apegados a métodos tradicionais que nem sempre avalia de verdade o conhecimento do aluno.
    O professor no texto queria avaliar quem adquiriu conhecimento, mas acabou por avaliar quem tinha habilidade em disserta sobre o tema. Luizinho mostrou para o professor, só que de outra maneira, que compreendeu muito bem o conteúdo, mas o professor não soube reconhecer, pois estava apegado ao método tradicional de avaliação.
    Percebo a falha do professor, principalmente pelo fato de não ter observado a deficiência do anulo em dissertar, acredito que um aluno não deva seguir em frente sem saber escrever um texto, mas o professor ao ver a limitação do seu anulo em escrever deveria ter encaminhado a alguém que pudesse ajuda-lo a desenvolver a escrita, como a professora de português ou a pedagoga da escola.

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  8. Muitas vezes o maior problema em sala de aula não está na forma que o professor ensina, mas sim na maneira como ele avalia. A avaliação deve ser criteriosa e sem preconceito!

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  9. Esse texto trata de uma prática ao meu ver, constrangedora e triste. Constrangedora porque o professor têm convicção de que o aluno conseguiu alcançar o aprendizado e teve que dar-lhe uma nota que muitas vezes castra e causa danos futuros no processo de ensino/aprendizagem do aluno. Mesmo sabendo a resposta do aluno certa, por uma questão de convenção, atestou que estava errada. Triste porque todo professor que não consegue mudar sua prática amarrada a formalismos, regras e normas, é apenas mais docente que faz parte do sistema.

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  10. O professor Marcelo com sua ilustre aula conseguiu prender a atenção dos alunos, e ainde melhor apenas com suas aulas ele fez com que um de seus alunos conseguisse imaginar como seria o Pantanal, e fez isso de maneira tao grandiosa que o desenho de seu aluno saiu perfeito, mais o que foi cobrado dos alunos depois da aula era uma redação, e infelizmente Luizinho não é bom com em redação, percebendo que seu aluno n teria escrito nem uma folha Marcelo ficou inquieto, mais ao ver o desenho de Luizinho ele se sentiu o grandioso como diz o texto. Só que o desenho de Luizinho por mais perfeito que estivesse serviu de que? Para nada, porque infelizmente a forma com que Luizinho descreveu o assunto estudado não foi em forma de redação, e Marcelo como prefessor não podia dar nota alguma pelo seu desenho.

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  11. Muito fácil é falar a respeito deste texto mas será que se estivéssemos diante de uma situação concreta, de que modo agiríamos??? O que faríamos diante das inquisiçoes dos outros alunos que fizeram tudo dentro das regras, que de per si chamam-se regras por um motivo bem forte!!! Devemos perceber que a avaliação consistia em fazer uma redação sobre um tema e não um desenho- por mais lindo e descritivo que fosse-, no caso em questão não recrimino o professor mas sim nosso sistema de avaliação em todos os patamares.

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  12. Este texto me relembra meu ensino médio. Meu professor de História (Toinho) dava uma aula espetacular, e suas provas eram difíceis. Certa vez numa prova de dez questões dissertativas, uma colega minha nao conseguia responde-las, porém ela fez como Luizinho, pegou algumas folhas de oficio e descreveu todo o seu conhecimento. Foram 3 folhas!!! Meu professor fez a sua avaliaçao: ela tirou 10. Alguns colegas chegaram a questionar, seu argumento foi simples: O que eu precisava saber, eu já sei, ela prendeu tudo o que foi ensinado.
    Toinho soube reconhecer, o verdadeiro valor das avaliaçoes, e acredito que ele teve a coragem de fugir a regra. Que pena que muitos professores sao como Marcelo e nao como Toinho.

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